A perda de visão por metanol, uma grave sequela de intoxicações por bebidas adulteradas, tem se mostrado duradoura e com poucas possibilidades de recuperação. Pacientes acometidos em São Paulo por essa contaminação enfrentam um comprometimento ocular que pode variar de parcial a total, e a reversão dessa condição é considerada rara, dependendo crucialmente da rapidez no início do tratamento após a ingestão da substância tóxica.
O dano visual decorre da forma como o organismo processa o metanol. Ao ser metabolizado, ele gera formaldeído e ácido fórmico. Este último, por sua vez, interfere no metabolismo do oxigênio nas células, provocando uma espécie de “asfixia celular” que impacta diretamente a capacidade respiratória dos tecidos. Para mais informações sobre intoxicações, consulte a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), uma fonte de alta autoridade na área de saúde pública.
Perda de Visão por Metanol Persiste Anos com Baixa Reversão
Conforme explica Marcus Gaz, cardiologista e gerente médico das unidades avançadas do Hospital Israelita Albert Einstein, os nervos corporais, especialmente o nervo óptico, são particularmente vulneráveis a essa privação de oxigênio. “Os nervos do corpo, em especial o nervo óptico, são os mais sensíveis a isso, então essas células acabam entrando em sofrimento e morrem, comprometendo a visão”, detalha o especialista. O resultado é um sofrimento celular que culmina na morte dessas células, impactando de forma severa a acuidade visual dos indivíduos afetados.
Evidências Científicas e a Permanência das Sequela Visuais
A literatura científica tem investigado a persistência das sequelas visuais pós-intoxicação por metanol. Uma pesquisa relevante acompanhou 27 sobreviventes de uma crise de envenenamento na Estônia, ocorrida em 2001, por um período de seis anos. Os achados dessa investigação indicaram que as sequelas, inclusive as visuais, permaneceram inalteradas ao longo de todo o período de acompanhamento, sugerindo que os danos podem ser irreversíveis e duradouros.
Outro estudo analisou a espessura da retina em 83 participantes, divididos em dois grupos: 42 com histórico de intoxicação por metanol e um grupo de controle. Os participantes foram monitorados por até quatro anos após o incidente. Os autores concluíram que os prejuízos neurológicos desencadeados pelo metanol podem continuar a provocar o afinamento da retina mesmo anos após a exposição à substância. Essa constatação aponta para a progressão ou a manutenção das sequelas visuais a longo prazo.
Flavio Mac Cord, diretor da Sociedade Brasileira de Oftalmologia (SBO), reforça a consistência desses resultados com a prática clínica. “Os achados são muito consistentes com os relatos de diferentes países e reforça que os danos causados pelo metanol são muitas vezes estrutural e irreversível”, afirma Mac Cord, sublinhando a gravidade e a natureza permanente dos danos oculares provocados pela substância.
Prevenção e as Limitações da Reversão Ocular
A forma mais eficaz de evitar o surgimento de complicações visuais relacionadas ao metanol é a administração precoce de antídotos como o etanol farmacêutico ou o fomepizol. Essas substâncias atuam bloqueando o processo de metabolização do metanol em ácido fórmico, prevenindo, assim, os problemas associados à toxicidade da substância, incluindo os danos à visão.

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No entanto, a agilidade no tratamento é fundamental. Conforme salienta Fábio Ejzenbaum, professor e chefe do Departamento de Neuroftalmologia da Santa Casa de São Paulo, “é importante retirar o metanol o mais rápido possível do corpo do paciente”. Essa prontidão minimiza as chances de desenvolvimento de danos irreversíveis no nervo óptico, um tecido neurológico de baixa capacidade de recuperação.
Emerson Castro, oftalmologista do Hospital Sírio-Libanês, compara a lesão do nervo óptico a uma lesão cerebral, indicando a dificuldade de recuperação. “É como se fosse uma lesão cerebral. É muito difícil você recuperar”, resume o especialista. Embora existam relatos de reversão de sequelas visuais, esses casos são raros e influenciados por fatores como a precocidade do tratamento e a quantidade de metanol ingerida; doses maiores implicam em menores chances de recuperação.
Tratamentos para Sequela: Evidências Insuficientes e Desafios
Pesquisadores têm explorado possíveis tratamentos para as complicações visuais decorrentes do metanol, mas a carência de evidências científicas sólidas ainda é um desafio. Castro menciona o uso de corticoides intravenosos, que poderiam oferecer benefícios na capacidade visual devido às suas propriedades anti-inflamatórias. Contudo, os reais benefícios são pouco conhecidos, e os relatos de melhoria se concentram na fase aguda da intoxicação, conforme Ejzenbaum, indicando que a substância não seria eficaz a longo prazo.
Outra linha de pesquisa, também mencionada por Castro, envolve o uso de antioxidantes e vitaminas do complexo B, visando a melhoria do funcionamento celular. No entanto, mais uma vez, faltam evidências robustas para comprovar a eficácia dessas abordagens no tratamento das sequelas visuais persistentes causadas pelo metanol.
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A gravidade e a irreversibilidade da perda de visão por metanol sublinham a importância da prevenção e do tratamento emergencial. Compreender os mecanismos e as limitações terapêuticas é crucial para lidar com essa ameaça à saúde pública. Para mais análises e notícias sobre saúde e ciência, continue acompanhando nossa editoria de Análises e mantenha-se informado sobre os temas mais relevantes do momento.
Crédito da imagem: Danilo Verpa -9.out.2025/Folhapress